A moça de meia-idade não olha para os lados quando entra alguém no elevador. No seu elevador.
"Qual o andar?", repete em intervalos não programados. O questionamento me recorda certa ocasião, em que perguntei qual era o andar de um amigo a um porteiro e o sujeito, impetuoso, levantou com riso frouxo no queixo, prestes a estourar, e pôs-se a imitar atabalhoadamente alguns passos do inquilino. Mas esse é outro caso. O de hoje é da ascensorista de cabelos presos que faz palavras-cruzadas de pé. Trabalha em um shopping de Curitiba - talvez o mais badalado deles - há sete meses. "Canso de ficar sentada," diz Selmira, sem erguer a cabeça. Apesar da negativa inicial, tem um sorriso quase fixo no rosto e alerta com vibração o andar tão desejado: "G3!".
Sete ou oito pessoas acotovelam-se educadamente até encontrarem o lugar perfeito para permanecer os próximos 30 segundos. Nenhum, no entanto, invade a privacidade e nem sequer chega perto da cadeira da mulher que já subiu e desceu tantas vezes na vida. O objeto, de couro e com hastes enferrujadas é giratório, ironicamente. Em metade das paredes do elevador há espelhos indiscretos. Na outra metade, nada, ou tímidos anúncios publicitários. Quando sozinha, giraria a cadeira? Não, há câmeras, não poderia fazer isso. Ao lado de seus pés, uma sacolinha de mercado amarela com o kit-elevador: comidas – besteirinhas, como bolachas e guloseimas – remédios genéricos, papel higiênico e livros de auto-ajuda.
A vida se passa ali, naquele sobe-desce perpétuo. Do L4 ao G3, por entre uma palavra mais difícil a ser descoberta, que inclusive precisou daquela olhadela marota no final da revistinha. Os agradecimentos não são muitos, apesar de todos os andares serem expelidos como se fossem o fim de uma missão por ela liderada. É nesse momento que sua cabeça volta à posição normal, mirando a revista apoiada no colo, colocando a caneta Bic em posição de ataque e se despedindo de cada um com o canto dos olhos.
(CRIS CASTILHO, de Curitiba)
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